A tarde dessa terça-feira, 18 de novembro, marcou o encerramento da II Semana de Diálogos Sobre Igualdade e Diversidade, promovida pela Corregedoria-Geral da Justiça do Tocantins (CGJUS) e pela Escola Superior da Magistratura Tocantinense (Esmat), com um ciclo de reflexões sobre identidade, pertencimento e justiça.
A reta final da programação foi pautada por temas que atravessam tanto a história quanto o presente das lutas por reconhecimento e dignidade no Brasil: os direitos das comunidades tradicionais e da população LGBTQIAPN+, além da necessária presença de mulheres em espaços de decisão.
Saberes ancestrais e o reconhecimento do território
Abrindo a programação da tarde, a palestra “Direitos das Comunidades Tradicionais” trouxe à centralidade do debate a perspectiva indígena sobre território, identidade e direitos fundamentais. A convidada doutora Eugislane Kawala Lima Karajá, servidora da Universidade Federal do Tocantins (UFT) e educadora indígena, compartilhou saberes e experiências a partir do lugar de quem vive e defende, cotidianamente, as múltiplas camadas de pertencimento dos povos originários.
“Agradeço por estar aqui hoje, por poder participar desse evento. Para nós, povos indígenas, poder ocupar esses espaços e contribuir com o diálogo é muito importante. É uma forma de levar a voz das nossas comunidades para além das aldeias”, afirmou a palestrante, que detalhou as bases conceituais e culturais que estruturam as noções de comunidade tradicional, entre elas o autorreconhecimento, a relação com o território e a transmissão de saberes por meio das gerações.

Ao explicar os elementos essenciais para o entendimento do conceito de comunidade tradicional, Eugislane destacou a importância da territorialidade, do uso dos recursos naturais de forma coletiva e sustentável e da diferenciação cultural como marcos fundamentais para o reconhecimento das especificidades de cada povo:
“Estamos falando de indígenas, sim, mas também de quilombolas, ribeirinhos, quebradeiras de coco babaçu, ciganos, entre outros. É uma diversidade de modos de viver que precisa ser compreendida e respeitada”.
Em sua fala, também pontuou a complexidade que envolve até mesmo a forma como os povos indígenas são nomeados. “O termo ‘índio’ carrega uma carga histórica de estigmatização. Por isso, o mais apropriado é utilizar ‘indígena’. No entanto, entre nós, há um uso afetuoso e de identificação do termo ‘índio’, que não nos agride como pode agredir quando vem de fora. É importante entender esse contexto”, contextualizou.
A Mesa foi mediada por Bruna Patrícia Ferreira Pinto, chefe de gabinete da Corregedoria-Geral da Justiça, e Ana Carolina de Brito Adorno, residente jurídica do TJTO.
A pauta LGBTQIAPN+ no Judiciário
Na sequência, às 15h, o auditório do TJTO se voltou à escuta e à reflexão sobre os “Direitos da População LGBTQIAPN+”. A palestra foi conduzida pelo desembargador João Marcos Buch, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC), com mediação da juíza Renata do Nascimento e Silva, coordenadora do evento, e da servidora Maria Clara Rezende, secretária executiva da Comissão de Prevenção e Enfrentamento ao Assédio Moral, Sexual e à Discriminação do 2º Grau.
Antes de passar a palavra ao convidado, a juíza Renata agradeceu o apoio do desembargador Pedro Nelson de Miranda Coutinho, corregedor-geral da Justiça, e destacou a importância do evento para o fortalecimento institucional das pautas de igualdade e diversidade.

Em sua fala, o desembargador João Marcos trouxe uma reflexão sobre privilégio, desconstrução e a necessidade de reconhecimento das múltiplas realidades que atravessam o Sistema de Justiça.
“Quando piso em um fórum, em um tribunal, me sinto em casa. Essa é a casa que escolhi e que tem como função nos aproximar da ideia de justiça. (...). Como homem branco, cis, vindo de uma família com estabilidade econômica, tive privilégios – e precisei aprender que aquilo que eu acreditava serem direitos naturais eram, na verdade, privilégios”, afirmou.
O magistrado compartilhou sua trajetória de aprendizado ao longo dos anos como juiz da área Criminal, destacando como o sistema muitas vezes neutraliza e invisibiliza corpos e vozes que não se enquadram na normatividade branca, heterocisnormativa e economicamente favorecida. A palestra convidou o público a refletir sobre o lugar de fala e o papel das pessoas aliadas às lutas por equidade.
Novos olhares
A pluralidade de temas e vivências compartilhadas ao longo do evento não apenas provocou reflexões, mas também despertou novos olhares e percepções entre os(as) participantes. Para a servidora Giann Magna de Oliveira Almeida de Moura, a experiência proporcionada pelo evento contribuiu diretamente para o fortalecimento da empatia e para a construção de uma cultura institucional mais acolhedora e consciente das realidades que atravessam os diferentes grupos sociais.
“Grande parte do preconceito surge da falta de conhecimento. Esses dois dias de diálogos sobre Igualdade e Diversidade foram uma imersão de cultura, história e aprendizado. Aprender sobre diferentes identidades e orientações nos ajuda a entender melhor a realidade das pessoas e seus desafios, fortalecendo a empatia e a convivência saudável”, afirmou.
Ela também destacou como esse tipo de iniciativa favorece a desconstrução de estigmas e o compromisso com uma atuação mais justa: “Compreender um pouco mais sobre a dor do outro reduz a propagação de mitos e narrativas nocivas, criando um ambiente mais seguro e acolhedor para todos. Conhecer essa realidade nos permite compreender por que políticas de proteção são necessárias e como cada pessoa (inclusive eu) pode contribuir para garantir que todos tenham seus direitos respeitados”.