Desafios enfrentados pelas operadoras, fraudes e medicina baseada em evidências fecham debates de Simpósio do Judiciário

Foto: Hodirley Canguçu

Evolução tecnológica, mix epidemiológico, recursos finitos x risco crescente, evolução do conhecimento, mudanças culturais e mudanças climáticas. Estes foram alguns gargalos apresentados pelo diretor-presidente da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), Paulo Rebello na palestra “O Papel regulador da ANS: desafios atuais”, que abriu a tarde de discussões do II Simpósio "O Direito e a Saúde: em foco a judicialização da saúde", realizado nesta sexta-feira (7/6), no auditório do Tribunal de Justiça do Estado do Tocantins (TJTO), por meio da Escola Superior da Magistratura Tocantinense (Esmat).

De acordo com a ANS, estima-se que os gastos privados com saúde correspondem a 5,7% do Produto Interno Bruto (PIB). Afinal, o plano de saúde é o terceiro maior objeto de consumo da população brasileira e isso garantiu às 671 operadores de saúde, mais de 51 milhões de beneficiários, movimentando R$ 275 bilhões. Na assistência odontológica são 33 milhões de beneficiários em 328 operadoras, que faturam R$ 4,3 bilhões. Os dados são de 2023.

No entanto, o presidente da ANS, Paulo Rebello, alerta: “Apesar de ser uma área que fatura muito, é preciso salientar que operadora não tem dinheiro. Quem tem dinheiro é beneficiário que paga as mensalidades. Ela é responsável pela gestão do recurso para que o beneficiário tenha condições de utilizar esta operadora quando tiver uma requisição médica”, explica Rebello destacando ainda que sobre as novas tecnologias incorporadas, as decisões judiciais individuais impactam todas as operadoras. “Todo brasileiro quer ter um plano de saúde, mas a maioria são operadoras de pequeno e médio porte instaladas nos rincões do nosso país. E quando um magistrado toma uma decisão de incorporar uma nova tecnologia ou um medicamento de alto custo, 20% dessas operadores não conseguem arcar e quebram. Impactam na coletividade e todos os beneficiários acabam pagando, pois não tem almoço grátis", concluiu.

A coordenação da mesa ficou a cargo do juiz do TJTO, Lauro Augusto Moreira Maia.

Fraudes na saúde

Esquemas fraudulentos como a criação de empresas fantasmas, fraude de reembolso, falso plano, inconsistências nas solicitações e procedimentos, assinatura falsa, alteração de identificador de boleto, procedimentos criados-não realizados, dentre outros, foram o tema do “Painel antifraudes na Saúde Suplementar” apresentado pelo superintendente médico da Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge), Cássio Ide Alves. A mesa foi coordenada pelo juiz Gil de Araújo Corrêa.

“As fraudes rendem muito dinheiro, mas quem frauda não está fraudando plano de saúde ou operadora, está fraudando toda a coletividade, pois os recursos são provenientes do individuo, das famílias e das empresas. As fraudes significam uma ameaça ao mutualismo e ao pacto intergeracional e traz impactos regulatórios importante, na sustentabilidade e na segurança.”.  

Na ocasião, o palestrante usou o exemplo da fraude do reembolso e do fornecimento de Órteses, Próteses e Materiais Especiais (OPME), este último evidenciado em 2015 com a CPI da Máfia das Próteses. Após essa crise, órgãos como a ANS e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) tomaram algumas medidas como a criação de um grupo técnico de trabalho pela ANS, Resolução Normativa Nº 424/2017 que trata dos critérios da Junta Médica, qualificação de protocolos cirúrgicos, Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) Anvisa para monitoramento econômico para acompanhar o setor de OPME que conta com mais de 80 mil registros no Brasil, contrato de regulação internacional da Anvisa.

O reembolso sempre foi uma prática normal. Porém, a partir de sua regulamentação, em 2022,  conforme entendimento da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ficaram definidos os seguintes critérios para reembolso: serviço ser prestado; efetivamente pago o valor cobrado; pagamento comprovado; vedado cessão de direito. “A fraude de reembolso não é a mais importante, mas está em destaque, já que a partir desta regulamentação, muitos destes tipos de prova são produzidos a partir destes critérios como a comprovação como falsos procedimentos, reembolso superfaturado com base nos critérios, entre outros”, explicou.

Medicina baseada em evidências

A coordenadora do Núcleo de Avaliação de Tecnologias em Saúde e Núcleo de Evidências no Hospital Sírio-Libanês, Rachel Riera, ministrou a última palestra do dia. Intitulada “Ciência na Tomada de Decisão Judicial em Saúde”. O coordenador de mesa foi o juiz Marcelo Laurito Paro, do Tribunal de Justiça do Tocantins.

“A boa ciência está no meio da ciência ruim e isso nos dá uma baita responsabilidade, identificar a boa ciência e deixar de lado que nos desvia da verdade. Assim como no Direito tem decisões boas e ruins, na ciência também, tem a boa e a ruim. A tomada de decisão em saúde precisa ser informada pelas melhores evidências científicas disponíveis. Para isso, é preciso saber identificar onde está essa boa evidência, desenvolvendo uma boa visão crítica em saúde, por exemplo”,  disse a palestrante Rachel Riera.

Avaliar Notas Técnicas produzidas pelo Núcleo de Apoio Técnico ao Judiciário (NatJus), elaboradas para avaliar os potenciais efeitos para casos específicos, são produtos científicos feito por agentes em tecnologia em saúde (ATSs) para subsidiar o magistrado. “A nota técnica é um instrumento valioso para o magistrado. Logo, ela tem que ter uma linguagem acessível, não podemos carregar nos termos técnicos, o magistrado tem que entender o que o profissional da saúde está falando”, concluiu.  

Após as palestras, foi aberto um debate com os participantes do Seminário conduzido pelo presidente do Comitê Gestor de Atenção Integral à Saúde do Poder Judiciário, desembargador Pedro Nelson de Miranda Coutinho, que fez ainda a entrega dos certificados dos palestrantes.


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