“Já não sou quem eu fui, já nem sei quem eu era, pois a vida sempre muda a cada nova primavera”. O trecho do poema “A mudança”, de autoria de Orion Milhomem, servidor do Tribunal de Justiça do Tocantins (TJTO), representa bem o sentimento que se espera despertar nas reeducandas da Unidade Penal Feminina de Palmas, a partir do Projeto Mentes Literárias: da magia dos livros à arte da escrita, lançado nesta quarta-feira (18/9), pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
O Tocantins é um dos cinco estados brasileiros escolhidos pelo CNJ para receber o projeto-piloto, alinhado às diretrizes da Resolução CNJ n. 391/2021, que incentiva a remição de pena por meio da leitura como prática social educativa no sistema prisional.
No Estado, inicialmente, a iniciativa será desenvolvida na Unidade Penal Feminina de Palmas, que conta atualmente com 44 reeducandas, mas a previsão é que se estenda a outras instituições penais. O projeto prevê a realização de rodas e oficinas de leitura e escrita, além da qualificação de acervos literários e da estruturação de bibliotecas nesses espaços. A metodologia inclui encontros quinzenais ou mensais ao longo de seis meses, promovendo a continuidade e o aprofundamento das práticas de leitura.
A iniciativa faz parte da estratégia nacional para universalizar o acesso ao livro e à leitura em estabelecimentos prisionais, conduzida pelo programa Fazendo Justiça, coordenado pelo CNJ em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud).
Durante o lançamento do projeto, a coordenadora adjunta do Eixo 3 do Programa Fazendo Justiça, Francine Machado, disse que a ideia é que possa ser trabalhado o acesso ao livro e à educação.
Eu costumo dizer que a leitura, a educação, é algo emancipatório, nos permite romper barreiras, atravessar mundos que muitas vezes a gente não conseguiria na realidade e isso vai nos permitir acesso a várias outras coisas.
Francine lembra que, também, está sendo trabalhado com todos os parceiros a possibilidade de doação de algumas obras para que esse processo possa se realizar e para que, além disso, possa ser garantida a remissão de pena para todos que participam do projeto.
Segundo o juiz da Vara de Execuções Penais de Palmas, Allan Martins Ferreira, o projeto é importante e o que for possível para consolidar o projeto será feito. “A gente sabe que a taxa de analfabetismo no Estado ainda é alta. E na CPP (Casa de Prisão Provisória de Palmas), onde existem 800 presos, nós temos ali algo em torno de 40 pessoas completamente analfabetas”, frisou, citando ações que o Poder Judiciário tocantinense tem feito para reduzir esse problema, como a aquisição de Mesas Educacional com recursos de multas pecuniárias.
O secretário executivo de Cidadania e Justiça, Hélio Marques, agradeceu o CNJ pelo olhar diferenciado ao Sistema Prisional do Tocantins e desejou boa sorte às reeducandas que vão participar do projeto. “Que vocês agarrem isso como uma oportunidade de vida, porque o conhecimento de fato liberta.”
Projeto
Ao apresentar o projeto Mentes Literárias, a assistente técnica do Eixo 3 do Programa Fazendo Justiça, Mariana Nicolau, citou que, no Censo Nacional desenvolvido pelo CNJ nos anos 2020, 2021 e 2022 e publicado no ano passado, indicou que 40% das unidades prisionais do País não possuem biblioteca e somente 26% das unidades prisionais têm algum projeto envolvendo a prática de leitura.
Foi a partir desses dados, o CNJ desenvolveu um plano nacional de fomento à leitura. E dentro desse plano, o projeto foi pensado. “Entendendo a leitura como um direito e um direito universal, a gente entende que esse direito precisa ser universalizado, que ele precisa atender todo mundo e precisa chegar pra todas as pessoas”, enfatizou.
“A gente entendendo que 40% das unidades prisionais no Brasil não têm nenhum livro sequer, a gente entende que uma campanha nacional de arrecadação de livros seja pontapé inicial e aí, graças ao apoio da Companhia das Letras, a gente conseguiu doação de acervo para a gente iniciar o projeto”, disse Mariana, informando que foram adquiridos livros para 200 unidades prisionais e, a partir de outros diálogos com outras editoras, estão conseguindo fomentar a doação de livros.
“Para além disso, um aspecto muito importante é a formação e a gente está pensando em algumas iniciativas que já tiveram início, com formações de mediadores de leitura”, comentou, explicando que mediadores de leitura são pessoas que vão conduzir as rodas de leitura. “A nossa ideia é que as pessoas privadas de liberdade também possam ser mediadoras de leitura e possam facilitar a leitura para as outras pessoas.”
Doação de livros
Além de apresentar alguns de seus poemas no evento, na oportunidade, o servidor Orion Milhomem fez a doação dos livros “Em ritmo de amor e poesia” e “No embalo do coração”, de sua autoria, à biblioteca da Unidade Penal Feminina.
O poeta Juarez Alencar Pereira, cordelista e servidor da Secretaria de Educação do Tocantins, também declamou uma poesia de cordel durante o evento.
Presenças
Também prestigiaram o evento o juiz auxiliar da Corregedoria-Geral da Justiça (CGJUS), Arióstenis Guimarães Vieira; a coordenadora da Cidadania da CGJUS, juíza Odete Almeida; a defensora pública Napociani Pereira Póvoa; a diretora da Unidade Penal Feminina, Rosilda Carvalho; o gerente de reintegração social, trabalho e renda ao preso e egresso, Dilson Júnior; e servidores do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas no Tocantins.