Criar e fortalecer vínculos entre alunos e comunidade escolar é essencial para sucesso da Justiça Restaurativa na Educação reforça palestrantes

Foto: Elias Oliveira (TJTO)

A solução foi apontada pela juíza do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDF), Flávia Pinheiro Brandão Oliveira, durante apresentação do projeto-piloto desenvolvido em uma escola pública de Planaltina (DF), bem como na experiência de Chicago (EUA) “Transformando Conflitos em Oportunidades de Crescimento”, apresentada pela educadora e membro do Chicago City Wide Restorative Justice Comittee, Eboni Rucker, no Painel III do 1º Encontro Nacional de Justiça Restaurativa na Educação, ocorrido na tarde da tarde desta quinta-feira (24/08), no auditório do Tribunal de Justiça do Estado do Tocantins (TJTO). O evento segue até sexta-feira (25/8).

Semente plantada em Planaltina (DF)

Para a efetivação do projeto-piloto foi realizado um curso de 30 horas entre o Poder Judiciário e a escola com o objetivo de capacitar os professores e corpo diretivo para a escuta qualificada; estreitamento de laços entre o próprio grupo escolar; círculos de fortalecimento de vínculos com alunos; necessidade de criação do conselho de paz. O curso foi finalizado na última semana.

“Apesar de bastante embrionário o projeto já ecoa na comunidade de Planaltina. Para saber onde vai dar é preciso começar e a nossa sementinha foi plantada e esperamos que ela cresça e dê bons frutos. O projeto é vivo, com necessidade de mudanças de acordo com as demandas que vão surgindo. Importante ressaltar que ele não é imposto na comunidade escolar, a adesão é voluntária. Tem que haver esse sentimento de pertencimento de todos os envolvidos no processo, isso é muito importante para êxito do projeto. Só assim iremos conseguir fazer a transformação de punição em reparação dos danos por meio do diálogo, pautado na lógica da não violência, pelo respeito, com base nos princípio dos direitos humanos”, declarou a juíza Flávia. 

Conexão leva a mudança

Na segunda palestra do Painel, a educadora Eboni Rucker apresentou o projeto implementado em uma escola de Chicago com 1908 alunos, onde foi instalada a Reset Room Supplies (Sala Restaurativa) onde foi observada a redução de 89% nos casos de suspensão de alunos após sua abordagem que consiste em escuta individual e coletiva, por meio de círculo, para avaliar e compreender as emoções. Nela são trabalhadas ainda com o corpo escolar: a empatia uns com os outros; a regulação das emoções; a tomada de decisão responsável; resolução de conflitos; problema de solução.

“Hoje, por exemplo, vocês estão vendo uma mulher negra vinda dos Estados Unidos. Lá a nação diz que todos podem estudar, mas nós negros não sabíamos como fazer isso. O racismo é ultrajante e traz muitos danos sociais e emocionais. Precisamos ver nossos alunos. Nas práticas da justiça restaurativa é importante explorar a história, conhecer e valorizar as pessoas, ter conexões. A conexão leva a mudança e isso é possível quando nossos corações se respeitam e permitem criar essas pontes. Quando você alcança o coração dessas crianças, você consegue ver a mudança acontecer. Maltratar, ignorar, ser indiferente só piora. Estamos falando de pessoas que necessitam ser salvas. Eu não faço nada que eles podem fazer por conta própria como amarrar um cadarço. Temos que saber o que está impedindo ele de se autocuidar. Temos que criar pontes e ajudá-los neste resgate por meio da equidade que é diferente da igualdade. Equidade está associada à justiça, o que cabe a todos, olhando a estrutura, o todo. Não é fácil, um processo longo que exige tempo e compaixão, com análise da estrutura familiar do aluno, condição socioeconômica, familiar, cultural e todas as condicionantes envolvidas”.

Alto nível

“O nível dos palestrantes está bem alto, vai ficar até complicado pra mim amanhã”, comentou em tom descontraído o professor Associado de Justiça Criminal na Governors State University em Chicago e Ph.D pela Escola de Justiça e Investigação Social da Arizona State University, João Salm que ministrará a palestra “O Duto Escola – Prisão na Experiência Norte Americana”, nesta sexta, às 14h30.

“Por exemplo, o que Eboni fez foi aprender mais sobre esses princípios e as práticas, como ela bem falou hoje, ao ler a literatura, estudar e pensar. Mas ela não bastou só estudar e aprender, mas pensar de que forma ela podia usar esse conhecimento para a transformação da escola dela. E, vendo onde estavam essas pessoas e necessidades, ela foi criativa e desenvolveu um projeto que hoje chama a atenção não só da escola dela, dos diretores, dos superintendentes, mas do Chicago Public Schools, que é uma organização, o quarto maior colegiado de alunos dos Estados Unidos. Criativa e colaborativa, não só envolver o diretor, o administrador, o superintendente, a secretaria estadual de educação, a secretaria municipal de educação, professores, o pessoal que trabalha na escola, da limpeza e acima de tudo, os alunos. Porque a partir do momento que tu convida os alunos pra esse processo democrático, de implementação de uma justiça democrática, tu tá espelhando a prática. Mas também a ideia da prática, não só em nível de resolução de conflito, quer seja dentro da escola, mas também na instituição e com os próprios alunos”, finalizou o professor doutor João Salm.


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